Maior exportador de tabaco do mundo, Brasil tem 138 mil famílias que vivem de cultivar a planta. Empresas acenam com emprego e renda, mas novos produtos exigem pouquíssimos fumicultores e podem derrubar demanda pela folha
O Brasil é o maior exportador de folha de tabaco do mundo, e o terceiro maior produtor. Essa produção é tocada principalmente por 138 mil famílias fumicultoras concentradas no Sul do país. Se o avanço global de novos produtos, como cigarros eletrônicos e sachês de nicotina, acontecer, a demanda por essa matéria-prima pode cair drasticamente.
A explicação é simples: é preciso pouquíssimo tabaco para se abastecer um vape. Em alguns casos, a folha pode até mesmo ser descartada. Muitos desses produtos usam nicotina, mas não necessariamente a que vem da planta do fumo. Ela pode vir de outras folhas ricas na molécula ou ser sintetizada em laboratório. E, mesmo quando a nicotina dos novos produtos vem do fumo, a necessidade dessa matéria-prima é menor.
O cenário é nebuloso. Mas os fumicultores brasileiros estão alheios aos riscos dessa mudança de mercado, impulsionada pelas gigantes do setor. O caso não é falta de informação, mas manipulação: a indústria do fumo tem vendido um futuro brilhante para esses agricultores.
Ao longo de cinco meses, O Joio e O Trigo mergulhou em documentos, planilhas, relatórios, estudos e projeções de empresas como British American Tobacco (BAT), Philip Morris International (PMI), Universal Leaf e JUUL. Conversamos com empresários, associações de classe da indústria e dos fumicultores, autoridades públicas e pesquisadores. Fomos a cidades que giram em torno desse cultivo e falamos com quem vive de plantar tabaco.
O resultado é o projeto “Cortina de Vapor”, uma investigação inédita lançada hoje (24) que mostra que os novos produtos exigem pouquíssimos fumicultores e variedades de fumo diferentes das cultivadas no Brasil.
A série de reportagens acende um alerta para todas as esferas de poder, mas especialmente o governo federal, que arrasta o lançamento de uma política pública voltada à transição do fumo para outras culturas desde 2024. E também para políticos de regiões que dependem do tabaco e entidades de fumicultores, que têm defendido a legalização dos cigarros eletrônicos sem saber, ao certo, quais serão os impactos no campo brasileiro.
