Grandes empresas conseguem emplacar indicações para assentos que cabem a faculdades e institutos de pesquisa em grupos de trabalho da agência reguladora, que opta pelo silêncio
A indústria de alimentos tem ocupado assentos que caberiam a universidades e institutos de pesquisa em colegiados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Embora disponham de lugares próprios, as empresas têm tido sucesso na estratégia de contar com pesquisadores alinhados, conseguindo influenciar na definição da agenda e das normas da agência reguladora. Graças a isso, o setor econômico chega a ter maioria em alguns espaços, em especial nos grupos de trabalho que fornecem subsídios à formulação de políticas públicas. E nós com isso? Os temas debatidos pela Anvisa têm incidência direta na saúde da população.
Essa relação vem de longa data, mas há sinais de que tem se fortalecido com o passar dos anos. O principal representante da indústria nos assentos da comunidade acadêmica é o International Life Sciences Institute (ILSI), criado em 1978 pela Coca-Cola. “O ILSI Internacional e o ILSI Brasil acreditam que o fórum científico é um fórum neutro e é o único fórum que pode dar respostas seguras para uma população que necessita de uma contribuição científica”, defendeu o diretor-presidente do ILSI, Ary Bucione, na entrevista que nos concedeu. A organização aberta nos Estados Unidos hoje conta com 17 regionais espalhadas pelo mundo, sempre buscando a interface entre ciência, indústria e governo. No Brasil, são quase 40 empresas patrocinadoras, entre elas Coca-Cola, Nestlé, Danone, Ajinomoto, Basf, Cargill, Pepsico, Unilever e Kellogg’s.
Revisamos mais de uma centena de atas de reuniões de grupos de trabalho na Anvisa. Entrevistamos dezenas de pessoas. Lemos o material científico apresentado por pesquisadores e diretamente pela indústria para embasar a tomada de decisão. E não encontramos nenhuma divergência relevante entre as posições das empresas de alimentos e do ILSI – e também de alguns professores com trabalhos financiados pelo setor privado. Pelo contrário, a convergência é constante. Não só isso, mas também o histórico de relações entre ciência, setor privado e agenda regulatória no mundo todo permite levantar interrogações sobre os efeitos desse processo.’
O ILSI é dividido em forças-tarefa, cada uma sobre um tema, nas quais integrantes de universidades e institutos de pesquisa dividem espaço com representantes das empresas. O instituto alega que essa composição veda a manipulação de resultados em favor de interesses privados, já que a área científica sempre tem maioria. E também diz que é proibido fazer lobby, embora admita promover advocacy, que é a influência sobre o poder público por organizações da sociedade, aqui entendida num caráter bem amplo – apresentando-se como “entidade sem fins lucrativos”, o ILSI, em tese, se encaixa nessa definição.
O congresso anual da organização contou em 2017 com a participação de um diretor da Anvisa pela primeira vez. Fernando Mendes Garcia Neto criticou “modismos alimentares” que, segundo ele, prejudicam a saúde da população, fazendo eco ao escopo argumentativo da indústria de ultraprocessados. “Sejamos participativos e propositivos em prol da construção de uma linha de atuação que nos permita estabelecer um mínimo de ordenamento regulatório que possa seguir em alinhamento com a evolução tecnológica desses produtos de forma a permitir, no menor tempo possível, a comercialização deles em situação que garanta eficácia e segurança no uso”, afirmou Garcia Neto.
O ILSI e outras organizações próximas à indústria têm trabalhado para agilizar processos dentro da Anvisa, especialmente no que diz respeito a novos produtos. Como a indústria investe forte em inovação, está sempre alguns passos à frente da agenda regulatória e da pesquisa acadêmica. Sempre que se pronuncia publicamente, Bucione enfatiza que o ILSI é uma organização científica. Porém, em algumas reuniões da Anvisa o instituto se faz representar por funcionários de empresas, inclusive Bucione, que é da DuPont, fabricante de ingredientes fornecidos à indústria de alimentos.
Aldo Baccarin, ex-Kraft Foods e presidente do ILSI de 2001 a 2015, representou o instituto no Grupo de Trabalho para Auxiliar na Elaboração de Critérios para Seleção dos Alimentos Passíveis de Veicularem Alegações e para Definir as Alegações de Função Plenamente Reconhecidas. “O ILSI é uma organização abstrata”, Baccarin nos respondeu, e fez um raro momento de silêncio durante a mais de uma hora de conversa realizada em agosto. “Sim, a gente manda as pessoas que têm o melhor nível de conhecimento, e sempre vão assessorados por alguém da ciência. Eles têm que tomar muito cuidado para, se ficar em qualquer momento claro que está tendo um conflito de interesses, essas pessoas têm que se abster e pular fora.”
O GT foi formado pela Comissão Técnico-Científica de Assessoramento em Alimentos Funcionais e Novos Alimentos, instalada em 1999, mesmo ano de criação da Anvisa. A agência era então presidida por Gonçalo Vecina Neto, professor da Faculdade de Saúde Pública da USP, que determinou que Franco Lajolo, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP e fundador do ILSI, coordenasse a criação da norma brasileira sobre alimentos funcionais. Essa norma baliza o trabalho da comissão, desde sempre dominada por representantes do ILSI, com o poder de aprovar ou reprovar alegações de benefícios à saúde em alimentos.
No grupo de trabalho aberto em 2013, a organização contou com dois assentos diretos. E ainda teve direito a mais duas cadeiras reservadas à academia: Hélio Vannucchi, professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP, e o próprio Lajolo, atual presidente do Comitê Científico do instituto, que durante um recente congresso da área médica se referiu a Bucione como “chefe”. Já Vannucchi, tanto nesse grupo como em outro de que fez parte, apresentou-se reiteradas vezes em nome do ILSI, apesar de inscrito como representante da USP.
Lajolo chegou a pedir durante as reuniões que margarinas, sopas prontas e chocolates pudessem receber alegações de benefícios à saúde. Ele é coproprietário de duas patentes. Uma, de 2007, sobre a farinha de banana verde, um alimento funcional. E outra, de 2011, financiada pela Sadia, que justamente tenta promover o prato pronto congelado como algo benéfico à saúde. Porém, no grupo de trabalho, a Anvisa adotou as alegações funcionais como exceção, e não como regra, fechando a porta para que ultraprocessados ou alimentos de baixo valor nutricional pudessem receber selinhos de “bons para a saúde”.
“A universidade teria que levar em conta a evidência científica e é sempre a hora em que a situação se complica. Essencialmente, os representantes da universidade não são uníssonos. Estão sempre divididos. Tradicionalmente, na Anvisa, os grupos ligados à indústria estão presentes. Não faltam. Têm um comprometimento com esses eventos que é de outro planeta”, resume Rafael Claro, professor da Universidade Federal de Minas Gerais, que participou do grupo de trabalho sobre alimentos funcionais.
Algumas pessoas que entrevistamos consideram que o problema está na forma como são feitas as indicações. Os GTs da Anvisa seguem uma fórmula previsível. A sociedade civil se opõe à indústria. A indústria se opõe a qualquer regulação. E os membros da academia são o fiel da balança, ou seja, conseguir nomear alguém no mínimo simpático a suas ideias pode desequilibrar o jogo. Em boa parte das vezes, as decisões não são tomadas por voto, o que significa que ter maioria não é ter vitória certa, mas uma chance maior de prevalecer.
“Verdade seja dita, hoje há um registro dos possíveis conflitos de interesse, mas até onde eu sei ninguém é vetado e a opinião de ninguém é descartada. Se a Anvisa fizer um código mais rígido, e fulano recebeu financiamento de determinada empresa, ele não vai falar como universidade: vai falar como empresa”, sugere Claro.
Em alguns grupos, a indústria conta ainda com a simpatia de institutos públicos de pesquisa. É o caso especialmente do Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital), um órgão do governo paulista vinculado à Agência Paulista dos Agronegócios. A própria missão institucional do Ital é estar a serviço da indústria. Hoje, para citar dois exemplos, o órgão rechaça a nomenclatura “ultraprocessados” para descrever alguns tipos de alimentos e alega que a obesidade é causada por hábitos pessoais.
Recentemente, o presidente do Ital, Luis Madi, defendeu durante seminário organizado pela Anvisa que não há evidências da associação entre obesidade e alimentos com altos níveis de sal, gordura e açúcar. “Em alguns momentos vocês induzem que o consumo de alimentos processados é o grande causador da obesidade, coisa que não existe evidência nenhuma. É uma questão ideológica”, disse, para em seguida ser contestado por alguns dos presentes, que elencaram várias evidências científicas que vão no sentido contrário.
A fórmula não é secreta
Em um encontro recente do Grupo de Trabalho de Nutrição e Alimentos para Fins Especiais, realizado no começo de julho, em São Paulo, a presidente da Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição (Sban), que, na verdade, estava inscrita como integrante da Unifesp, demonstrava certa impaciência com os pormenores da discussão sobre a rotulagem de fórmulas infantis para crianças maiores de um ano. Os detalhes são justamente o motivo de ser do grupo, que atua desde 2010 discutindo as normas internacionais nessa área, um trabalho que pode custar horas em torno de uma palavra ou uma frase.
“Antigamente, tinha uma fórmula só. E ninguém morreu por causa disso. Eu fui criada com Leite Ninho”, disse Olga Amâncio, presidente da Sban, uma organização parceira do ILSI que vem recebendo críticas pelas relações com as grandes empresas de alimentos. Recentemente, a Sban promoveu vídeos nas redes sociais em defesa do leite de vaca e teve a Nestlé como maior patrocinadora de um congresso.
Na Anvisa, Olga discordou da necessidade de informar no rótulo que aquele alimento é complementar à dieta e não um substituto, porque considera por óbvio que ninguém dará fórmula a um bebê durante o dia inteiro, uma interpretação que provocou certo mal-estar dentro da sala entre as defensoras do aleitamento materno.
No final de outubro, durante audiência pública na Câmara, a Sban apresentou-se contra a criação de um imposto especial sobre os refrigerantes. A representante da entidade, Marcia Terra, afirmou que, embora não se tenha até o momento fechado posição em torno do assunto, as evidências científicas iriam no sentido de mostrar que a medida é pouco eficaz.
Dias depois, ela, em nome da Sban, e pesquisadores do Ital estiveram em evento da Associação Brasileira das Indústrias de Alimentação (Abia) para defender o modelo de rotulagem frontal proposto pelo setor privado. O tema é central nos debates atuais da Anvisa, que até o momento não se decidiu entre o sistema defendido pela sociedade civil e o advogado pelas empresas.
Marcia Vitolo, professora aposentada da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, integrou o GT sobre fórmulas infantis nos últimos anos. Ela não tem dúvidas de que a forma como são estruturados os grupos da Anvisa é o cerne da questão. “Em cada reunião, vai um grupo diferente. Essa descontinuidade faz com que o processo fique vulnerável, o que é de interesse maior da indústria”, resume. “Porque a indústria tem uma continuidade. Os profissionais técnicos, acadêmicos, que vão de alguma forma tentar dar o olhar da população, estão abarrotados de coisas. Têm demandas monstruosas.”
O GT de que fez parte Marcia Vitolo atua numa questão muito delicada. As fórmulas infantis são o tópico que fez saltar à vista como a influência da indústria pode minar os conhecimentos científicos, resultando em décadas de desinformação das mães sobre os benefícios do aleitamento materno. Embora a indústria hoje admita que nada é melhor do que o leite natural, ainda há um forte jogo de pressão nessa seara, que pode ser facilmente reconhecido nas atas da reunião, com sucessivas tentativas de evitar qualquer restrição a esses produtos. O ILSI se opôs a que se adotasse a inscrição “Não nutricionalmente necessário” nos rótulos das fórmulas para bebês acima de 12 meses, tese defendida por parte da comunidade acadêmica e pela sociedade civil.
“O conflito de interesses às vezes é muito velado”, resume Renata Monteiro, pesquisadora do Observatório de Políticas de Saúde Alimentar e Nutrição da Universidade de Brasília que participou de grupos de trabalho na Anvisa e no Ministério da Saúde. “Eu sou uma profissional de saúde, então, quando sou chamada a um espaço assim, sei exatamente qual é meu papel. Quando se trata de um acadêmico mais próximo à indústria, é mais difícil. Porque não está tentando discutir a questão da ciência: está para intermediar a indústria com a questão acadêmica, tentar criar argumentação acadêmica para justificar algumas coisas que a indústria quer fazer. Tem pessoas que são extremamente renomadas, estão na Anvisa há anos, fazem parte desses grupos de trabalho. E ao mesmo tempo são gestores de instituições ditas científicas.”
No começo de 2017, o setor produtivo apresentou ao GT dois artigos de revisão que deveriam ser tomados como material de referência, dada a escassa bibliografia brasileira sobre o tema. Ambos tratavam da inadequação da dieta de bebês, enfatizando o alto consumo do leite de vaca, o que pode levar à conclusão de que há baixo consumo de fórmulas. Um deles era assinado por professores de universidades federais em parceria com um funcionário da Danone.
Sem cores
Em 2007 a Anvisa emitiu um informe técnico sobre o corante tartrazina, acusado de provocar reações alérgicas que começam com coceiras e dores de cabeça e podem terminar em fechamento da glote e reação anafilática. O corante, de cor amarela, está presente em vários alimentos industrializados: balas, doces, refrigerantes, mostarda e por aí vai. Embora o relatório governamental informe que a FDA, a Anvisa dos Estados Unidos, exige que os rótulos tragam uma mensagem de advertência, a conclusão foi de que o mesmo não deveria se aplicar ao Brasil.
Não que aqui os consumidores não estejam expostos a riscos. Estão. O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) pautou as discussões anos antes, logo nos primórdios da Anvisa, pedindo que a rotulagem fosse explícita quanto à tartrazina. É possível notar que a agência caminhava nesse sentido. Até que o ILSI se colocou à disposição para ajudar.
“Identificamos no mundo os formadores de opinião. Os caras no mundo que entendiam muito de corantes. Nós trouxemos pessoas de centros de pesquisa, universidades, indústrias”, conta Aldo Baccarin. “Se falava tanto que os corantes causavam alergias. A gente não tinha evidências para bani-los.” Logo em seguida, a Anvisa emitiu uma resolução na qual definiu que bastava que a tartrazina fosse declarada na lista de ingredientes, sem qualquer alerta.
Porém, ainda seria conduzido um estudo que poderia levar a uma reavaliação do caso. A Anvisa decidiu, então, contratar Beni Olej, da Universidade Federal Fluminense, que integra o Conselho Científico Consultor do ILSI. Com base nisso, emitiu o informe técnico de 2007. Dois anos depois, a Justiça Federal em São Paulo determinou que a Anvisa editasse uma nova resolução que previsse um alerta expresso quanto à presença de tartrazina. Mas a decisão foi suspensa.
Nós não temos o direito de duvidar da seriedade do grupo comandado por Olej. Nem dos cientistas trazidos pelo ILSI para embasar a decisão da Anvisa. Mas nós devemos nos perguntar se não havia outro grupo, desvinculado dessa organização, capaz de conduzir uma análise independente, e se não há outros cientistas relevantes que deveriam ser ouvidos. Não se trata de um caso isolado: vimos que a capacidade de mobilização da indústria de alimentos e de organizações ligadas a ela faz com que algumas correntes da ciência tenham maior presença no processo decisório.
Em 2003, o ILSI opôs-se à colocação de alerta sobre rotulagem de alimentos com glúten, alegando que a mensagem provocaria confusão. E, recentemente, fez oposição à resolução da Anvisa sobre rotulagem de alimentos com potencial alergênico. “O ILSI faz ciência com evidência. Então, enquanto não tiver evidência, a gente não apoia ações que são simplesmente questionamentos, sem a avaliação do risco, que é o necessário para esse caso”, resumiu Maria Cecília de Figueiredo Toledo, professora aposentada da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp, durante um debate sobre o assunto no qual marcou posição contra Cecília Cury, uma das coordenadoras da campanha Põe no Rótulo, que teve êxito em conseguir a colocação de alertas nas embalagens.
Portas abertas
A Anvisa adotou recentemente uma norma interna sobre conflito de interesses, adequando-se à também recente legislação federal sobre o tema. Porém, tanto a regra como a lei vão em mão única, dizendo apenas o que cabe ao servidor público e não a quem se relaciona com o poder público. Buscamos saber se o Comitê de Ética da agência reguladora ou a Diretoria Colegiada tomam atitudes quanto a essa questão, mas a assessoria de imprensa optou por vetar entrevistas e não enviar qualquer resposta, mesmo com pedidos reiterados desde o começo de agosto.
As resoluções da Anvisa seguem um rito. Primeiro, é preciso que o assunto entre na lista de prioridades de regulação. Depois, que comece a ser debatido. Em seguida, edita-se uma proposta de resolução, ou seja, um esboço da norma, que é submetido a uma consulta pública e recebe contribuições dos interessados. O ILSI é assíduo em todas essas etapas.
Há vários assuntos em discussão que despertam o interesse do instituto.
A Anvisa está definindo novas normas para que um alimento possa ser considerado integral. O ILSI organizou dois eventos a respeito em agosto e setembro.
Uma nova regulação para suplementos alimentares, de forma a tornar mais rápida a liberação de produtos, teve debates promovidos pelo instituto, que também se envolveu em uma discussão parecida quanto a probióticos, que são alimentos ou medicamentos usados para melhorar a composição da microbiota intestinal (vulgo flora). Ao que tudo indica, a Anvisa caminha para dar “maior flexibilidade” à liberação de produtos, adotando o modelo canadense apresentado justamente por acadêmicos próximos à indústria e por uma consultoria parceira do ILSI.
Os materiais do instituto sobre macro e micronutrientes constituem a base de referências da Anvisa. Há integrantes do ILSI que reservaram para si há muitos anos o único assento da comunidade acadêmica na delegação brasileira para o Codex Alimentarius, espaço de definição das normas globais sobre alimentação e comércio.
“Não resta a menor dúvida. Temos um convívio bastante estreito com eles, mas nos reservamos às reuniões que sejam meramente de caráter regulatório. Sempre que a Anvisa nos pede pareceres da área científica, sim, aí nós temos um relacionamento bom e muito interessante, que tem contribuído bastante para as reuniões da própria Anvisa”, diz Bucione, o atual presidente do ILSI.
A tentativa do setor privado de ocupar espaços acadêmicos não é um fenômeno brasileiro. A organização não governamental US Right to Know revelou recentemente uma troca de e-mails entre dois ex-executivos da Coca-Cola. Alex Malaspina, fundador do ILSI e ainda influente na organização, e Ernest Knowles, ex-vice-presidente de relações institucionais da Coca, demonstravam preocupação com os rumos do debate sobre obesidade. Knowles sugere que a empresa deveria estar à frente dessa discussão, financiando organizações médicas e científicas e fortalecendo a ação do ILSI na busca pelas causas dessa epidemia.
O Observatório de Corporações da Europa publicou em 2012 um documento mostrando que o ILSI teve portas abertas no órgão regulador da alimentação no continente, o EFSA. O próprio ILSI admite ter conseguido enfraquecer as linhas de atuação do órgão público em relação a transgênicos, com a dispensa de testes mais profundos sobre como a alteração genética pode mexer com vários componentes nutricionais.
No geral, conclui o Observatório, é esse o papel do instituto: atuar por regras mais brandas que signifiquem economia milionária (ou bilionária) para as empresas patrocinadoras. Depois de várias evidências de que o ILSI estava dando as cartas em decisões importantes do órgão regulador, a EFSA adotou um novo padrão de relacionamento e decidiu excluir o think tank da tomada de certas decisões. Diante dos protestos do ILSI, a então diretora-executiva da EFSA, Catherine Geslain-Lanéelle, escreveu uma carta na qual fala que a organização representa “interesses particulares” e que a agência está “muito bem posicionada para saber a natureza de seu trabalho”.
Por aqui, a Anvisa optou pelo silêncio.