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iFood recebe nota dois em ranking de trabalho justo da Universidade de Oxford

Seis plataformas da “economia dos bicos” foram avaliadas. Empresa brasileira tirou nota zero nos quesitos remuneração, condições justas e gestão justa

A iFood, maior plataforma de entrega de refeições do Brasil, tirou nota 2 de 10 em um relatório de trabalho decente elaborado por pesquisadores brasileiros em parceria com a Universidade de Oxford. 

A pontuação foi atribuída após um processo de pesquisa que incluiu dados públicos, informações fornecidas pela empresa e entrevistas com trabalhadores, levando em consideração cinco critérios: remuneração justa, condições justas, contratos justos, gestão justa e representação justa. 

Além da iFood, também foram avaliadas Uber Eats, Rappi, Uber, 99 e GetNinjas. Dessas, a iFood foi a que alcançou a melhor pontuação – Uber Eats e Rappi tiraram nota zero.

A iFood foi capaz de comprovar medidas em curso para pontuar em dois quesitos do relatório: contratos justos e representação justa. A empresa elaborou uma versão ilustrada de seus termos de uso, se comprometeu a avisar trabalhadores sobre quaisquer mudanças contratuais com antecedência de 30 dias e criou um Fórum de Entregadores, com a presença de lideranças da categoria. 

Nos quesitos remuneração, condições e gestão justa, no entanto, a plataforma tirou nota zero, já que não conseguiu comprovar que garante ao menos um salário mínimo mensal para todos os seus entregadores “parceiros”, os protege de perigos inerentes ao trabalho na plataforma – como acidentes, roubos e exposição ao sol – e não se isenta injustificadamente de responsabilidades sobre eles.

Segundo o relatório, as principais reclamações dos trabalhadores da plataforma têm a ver com bloqueios injustos, baixas remunerações e a dificuldade de falar com representantes humanos quando precisam de suporte. 

Os entregadores “parceiros” também mencionam as tarifas e horas de trabalho altamente voláteis, o que causa insegurança sobre a perspectiva de renda, e a dificuldade de acessar os Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) fornecidos pela empresa durante a pandemia. 



Segundo dados das consultorias Statista e Measurable AI, a iFood domina de 68% a 83% do mercado brasileiro de delivery. Uma fonte aponta que em abril de 2020 o aplicativo contava com uma força de trabalho de 175 mil entregadores.

Coordenador do relatório, Rafael Grohmann, professor da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), define a Fairwork como uma “pesquisa-ação” e diz esperar uma mudança na postura das empresas após a publicação do relatório. 

“A gente vai intensificar o trabalho de diálogo com todos os atores envolvidos, incluindo as plataformas”, diz. “Nem sempre é uma conversa fácil, mas a ideia é continuar pressionando por mudanças.”

Ele também acredita que o tema deve ser pautado com força nas eleições deste ano, e que o relatório pode ajudar na elaboração de políticas públicas que auxiliem os trabalhadores.

“Esse vai ser um tema relevante durante as eleições porque o Brasil tem uma das maiores populações trabalhando por plataformas no planeta”, diz o professor. “Nesse sentido, os princípios do Fairwork mostram que alternativas ao atual cenário são possíveis.” 

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O relatório destaca que, apesar de alguns esforços pontuais, “as seis plataformas falharam em garantir direitos trabalhistas básicos”, lembrando que as empresas se aproveitam da classificação precária dos trabalhadores como autônomos para se eximir da garantia de direitos como salário mínimo e limite de jornada. 

Além disso, os pesquisadores pontuam que as empresas agem para evitar qualquer reconhecimento judicial de vínculo empregatício. 

“As plataformas digitais têm usado estatísticas judiciais (jurimetria) para impedir a formação de precedentes contrários”, diz o relatório. “E, assim, manipular as estatísticas de decisões da Justiça do Trabalho, realizando acordos quando a ação trabalhista é distribuída para juízos geralmente favoráveis aos trabalhadores.”

O projeto Fairwork é coordenado pelo Instituto de Internet de Oxford e pelo Centro de Ciências Sociais WZB Berlin e conta com pesquisadores em 27 países. Os cinco princípios utilizados no projeto foram elaborados junto à Organização Internacional do Trabalho (OIT).

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