Reportagem exclusiva sobre frigoríficos provoca investigação no município de Canaã dos Carajás para averiguar saúde de trabalhadores
O Ministério Público do Trabalho (MPT) da 8ª região, reponsável pelos estados do Pará e Amapá, instaurou um inquérito civil para averiguar as ocorrências de contaminação por covid-19 de trabalhadores no Frigorífico Rio Maria, em Canaã dos Carajás/PA. A investigação foi aberta com base em reportagem do Joio publicada no início de junho.
De acordo com o último boletim epidemiológico do munícipio, de 5 de julho, Canaã dos Carajás, com apenas 36.027 habitantes segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), chegou a 2.211 casos confirmados do novo coronavírus, o que representa uma incidência de 5.961 casos a cada 100 mil habitantes – muito além da média nacional (762) e da média do estado do Pará (1.322).
O Ministério Público ainda informou que requisitou, imediatamente após a reportagem, a fiscalização do local pela Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, hoje atrelada ao Ministério da Economia, do governo federal, e expediu uma notificação recomendatória elencando medidas a serem implementadas pela empresa para o enfrentamento e contenção do novo coronavírus.
“É importante a atuação dos jornalistas, principalmente nos interiores dos estados, como no caso de Canaã dos Carajás, para dar visibilidade a violações de direitos fundamentais, articulando com instituições como o Ministério Público do Trabalho. O jornalismo é um verdadeiro instrumento de garantias de direitos fundamentais, provocando autoridades e conscientizando a população”, relatou Juliana Beraldo Mafra, procuradora do trabalho da 8º região e responsável pela investigação em Canaã.
O Projeto Nacional de Adequação das Condições de Trabalho em Frigoríficos presta apoio técnico aos procuradores do trabalho no Brasil e já implementou medidas de proteção à saúde de mais de 170 mil trabalhadores no período da pandemia. Os Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) foram firmados com quase uma centena de unidades frigoríficas no país para garantir condições dignas de trabalho.
“Importante vocês levantarem essas situações, porque traz um olhar diferenciado, não simplesmente a ação e o resultado no âmbito processual, mas a realidade social dos trabalhadores de frigoríficos. E fica cada vez mais evidente a importância da atuação e o fortalecimento dos sindicatos, que devem estar próximos à realidade vivida pelos trabalhadores. A pandemia trouxe luz à necessidade de sindicatos fortes e ativos, pois os trabalhadores são, sem dúvidas, os que mais estão expostos ao risco do contágio e serão os mais afetados aos riscos econômicos pós-pandemia”, diz o procurador Lincoln Roberto Nobrega, vice-gerente do Projeto de Adequação das Condições de Trabalho em Frigoríficos do MPT.
Até agora existem 213 investigações em andamento (inquéritos civis e verificação de cumprimento de TACs) e 16 ações civis públicas – em onze dessas ações foram solicitadas as paralisações das unidades. Os dados são do Ministério Público.
Os funcionários do Frigorífico Rio Maria que prestaram depoimento relataram que, depois da reportagem, o uso de máscaras passou a ser obrigatório na fábrica. “Agora, quem anda sem máscara, tem advertência”, informou um trabalhador.
A reportagem do Joio mostra que a maior concentração de frigoríficos de inspeção federal, pelo menos 80%, está em municípios brasileiros com menos de 100 mil habitantes, onde os sistemas de saúde são frágeis, a média salarial é baixa e há poucas associações organizadas por trabalhadores. As próximas matérias irão apontar outros frigoríficos com nomes não tão conhecidos, todos com casos de covid-19 e sem nenhuma representação política ou apurações pela mídia tradicional.
É importante lembrar que qualquer cidadão pode fazer denúncias ao Ministério Público do Trabalho. O “MPT PARDAL”, é um aplicativo desenvolvido para facilitar a produção de provas relacionadas a denúncias de graves violações a direitos dos trabalhadores e está disponível para download para plataforma IOS e Android na Google Play. A denúncia pode ser feita por meio de imagens, vídeos ou áudios, que devem ser acompanhados da descrição e local do fato.