O Joio e O Trigo

O que sabemos sobre Bolsonaro e a questão indígena

Depois que a gente cresce e sai da escola, percebe que a questão indígena, no Brasil, vai muito além das historinhas contadas sobre as culturas e tradições, quase sempre tratadas como primitivas e inferiores. 

Pensar nos povos originários dessa terra é se deparar com um mundo de violência, morte e omissão. Há mais de 500 anos a civilização branca vem atacando sistematicamente os direitos de milhares de etnias tradicionais. Mas, de 2018 pra cá, com a eleição de Jair Bolsonaro, a questão ganhou uma nova camada de desumanidade. 

Desde que assumiu o governo, a política adotada tem sido a de passar a boiada, a tratorada, a motosserra, tudo. Segundo o CIMI, Conselho Missionário Indigenista, em 2020, foram 182 assassinatos de indígenas, 63% mais do que em 2019. A Funai, principal órgão de proteção das Terras Indígenas, foi minada por dentro: em fevereiro de 2021, 60% das coordenações da Fundação na Amazônia eram chefiadas por militares. 

A instituição também deixou de ter controle sobre as demarcações de terras. A competência passou a ser do Ministério da Agricultura. Os lobos cuidando do galinheiro. Neste fio, longe de ser exaustivo, reunimos alguns pontos que sabemos sobre a questão indígena no Brasil.

1. Não dá pra ignorar o agro

Para o agronegócio, não importa quantas árvores tenham que de derrubadas, quantos rios serão assoreados, ou quantos indígenas serão tombados. A demanda do mercado dita o ritmo do avanço sobre a floresta. O Ministério da Agricultura projeta um crescimento anual na produção bovina entre 1,4% e 2,4% até 2030. A expectativa é abater até 12 milhões de toneladas por ano para atender o mercado, em especial as exportações.

Os produtores de soja também estão organizados para levantar barreiras contra a demarcação de terras, um verdadeiro lobby personificado na Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). Os monocultivos pressionam a floresta, no lugar da biodiversidade, incluindo aí, saberes tradicionais e uma vida em sinergia com o ambiente ao redor, entram pastagens, soja, milho. 

O controverso projeto Agro Xavante criou uma cooperativa agrícola dentro da Terra Indígena Sangradouro/Volta Grande para o monocultivo de arroz e soja. A iniciativa, chamada de “Independência Indígena”, prevê que 80% da produção agrícola fique com os fazendeiros e apenas 20% com os indígenas. O discurso de desenvolvimento sempre presente para dar corpo narrativo à uma política colonizadora e violenta.
Como dissemos, a Funai, desde o início do governo Bolsonaro, deixou de cumprir seu papel principal de proteção dos povos. Com o aval da Fundação, uma ferrovia ameaça a Terra Indígena Tadarimana, no Mato Grosso, onde vivem os indígena da etnia Bororo. O Ibama tampouco foi capaz de fazer frente. A direção atropelou a área técnica para garantir concessão “perpétua” à maior operadora ferroviária do Brasil para a construção dessa ferrovia.

2. Omissão e violação de direitos, a gente vê por aqui

A Frente de Proteção Etnoambiental da Funai confirmou a existência de um grupo nomeado como ‘isolados do Mamoriá Grande’, no sul do Amazonas, no fim de 2021. Foram enviados relatórios à sede, em Brasília, mas não houve retorno da própria Funai e da Coordenação Geral de Índios Isolados e Recém Contatados (CGIIRC). Um fato raro e histórico completamente negligenciado pelo poder público. 

“A Funai receber uma informação como essa e não fazer nada é quase um genocídio. É virar as costas a uma situação que você sabe que vai ser terrível se não fizer nada. E o governo faz o contrário, incentiva uma ação contra os povos isolados que estão ali dentro”, desabafou Sidney Possuelo, ex-presidente da Funai, em entrevista ao Joio. 

3. A exploração e o genocídio ainda não tiveram fim

Muito longe de ter todos os direitos assegurados, os povos indígenas do Brasil são explorados, invadidos, ameaçados e mortos. Pela ação direta e indireta da civilização branca, como foi possível ver na fase mais crítica da pandemia de covid-19. Alguns territórios, sem acesso ao básico mesmo antes da pandemia, sofreram mais ainda com a chegada do vírus. 

O cenário é tão grave que, mesmo com o risco sanitário, os Xavante foram até Brasília protestar contra o avanço do agronegócio e do Marco Temporal – que  tenta condicionar a demarcação das terras indígenas do país ao momento de promulgação da Constituição Federal de 1988.

E, como outras minorias oprimidas pelo capital, os indígenas também sofrem com a exploração no mundo do trabalho. Nos pomares de maçã do Sul do Brasil, indígenas de etnias como Guarani, Kaiowá, Terena, Kaingang e Xoklengs, são submetidos a baixa remuneração e condições insalubres de moradia.


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